“Não podemos convencer ninguém, podemos inspirar e contagiar”

Nessa entrevista, o permacultor Sérgio Pamplona defende que temos que agir para reverter o esgotamento dos recursos naturais e sugere a permacultura como um caminho inspirador, especialmente se adotada nas escolas

O arquiteto e permacultor Sérgio Pamplona esteve com a Comunidade Gaia Escola em dois encontros, nos dias 30 de abril e 7 de maio, para trazer reflexões sobre como tomar um rumo enquanto sociedade para evitar o colapso e como trazer as crianças e escolas para esse caminho. Para “caminhar sua fala”, Pamplona compartilha sua experiência como permacultor, morador e fundador do sítio Nós na Teia, em Brasília (DF), uma comunidade-escola de Permacultura, com projeto embrionário de Aldeia Permacultural, localizada no Jardim Botânico.

“Nosso sistema é muito hábil em camuflar os colapsos e mudanças, precisamos estar atentos aos sinais, e eles já estão aí”, ressaltou ao falar sobre as mudanças climáticas. “Estamos criando condições para destruir nossa espécie”, alertou Pamplona, ao explicar a crise ambiental e social que vivemos: mudanças climáticas; degradação do solo, declínio da infraestrutura e o pico do petróleo. Nossa civilização é dependente do petróleo, mas, e quando ele acabar?

Segundo Pamplona, estamos desconectados dos ciclos da natureza e do viver em comunidade. A permacultura e seus princípios de cuidar das pessoas, cuidar da terra e promover a partilha justa,  vem para nos reconectar, surge para transformar um possível colapso em um “declínio criativo”. Ao fechar ciclos, a permacultura traz a consciência sobre o nosso consumo, o uso da água, a forma de construir, plantar e como promover a “cultura da permanência”. “É urgente colocar essas questões na escola”, conclui.

Confira abaixo entrevista exclusiva com o arquiteto:

Nos encontros do Gaia Escola você tratou sobre o caos para o qual o mundo está se encaminhando e apresentou a permacultura como uma solução.  Qual a função da permacultura na construção de um mundo sustentável?

É a mudar o nosso pensamento, de monofocal em crescimento e competição para um pensamento alinhado com sistemas naturais. A humanidade tende a entropia, acelerar o caos e temos o potencial, conhecimento para realizar um caminho inverso. A permacultura traz ferramentas para ativar esse conhecimento e fazer uma forma diferente, inspirada na natureza, para podermos construir uma sociedade humana que se diferencia do que vemos hoje, embora traga muitas coisas das sociedades tradicionais.

Existe uma falsa ideia de que a permacultura só é possível em contextos rurais, ou em casas. Como você vê a permacultura urbana? O que posso fazer morando na cidade?

A permacultura começa do indivíduo sempre. Morando em apartamento você pode trabalhar seus resíduos em minhocário de cozinha, produzir seu alimento na varanda e, indo um pouco além, pode começar a ocupar espaços urbanos, transformar espaços perdidos em espaços produtivos. Aí você entra em um outro desafio da permacultura que é articular comunidades, porque na cidade você pode estar “longe da natureza”, mas está perto de outras pessoas. É uma questão de trabalhar comunidades para poder realizar intervenções efetivas no espaço urbano, hortas urbanas, sistemas agroflorestais urbanos, se associar para fazer compras coletivas, criar uma Comunidade que suporta o agricultor (CSA). Há várias atividades possíveis, mesmo que o contato com a natureza esteja limitado por você morar num apartamento, se você consegue expandir os princípios da permacultura para a comunidade, você começa a ter um potencial grande, muitas cabeças, muitas mãos. O que é problema de um lado, é solução do outro. Muitas pessoas juntas com esse propósito têm um poder de transformação enorme. Vejo a permacultura urbana como uma possibilidade de articulação das pessoas para redefinir o espaço urbano.

Qual o papel da escola nessa articulação da comunidade para a construção de um mundo sustentável e o principal desafio de implementar a permacultura nas escolas?

Se conseguirmos quebrar os portões e integrar a escola à comunidade, ela poderia ser um ponto focal de todas as mudanças. O principal desafio é a mudança de cultura e de visão, para que essas coisas façam sentido e não sejam apenas iniciativas isoladas, para que elas sejam realmente relevantes e alinhadas com os princípios da permacultura, do que queremos fazer. A dificuldade é descobrir como fazer isso ser inserido na cultura escolar, sempre temos um professor empolgado, ou dois, mas num contexto onde há vários empurrando com a barriga, essa cultura é um grande entrave. De repente, quando a necessidade for maior devido às condições externas, sociais, climáticas e econômicas, seja mais fácil viabilizar.

Como você vê o papel do Gaia Escola nesse futuro?

Acho muito legal, porque cria um grupo de apoio, uma comunidade de suporte, pessoas oriundas de várias escolas diferentes podem se apoiar e focar em ações comuns. Eu vejo que isso, de trazer outras pessoas das comunidades escolares, nas próximas edições, pode potencializar o trabalho. Acho importante, um trabalho que tem que ser feito, mas que é um trabalho que exige tempo, construindo, repetindo, trazendo mais gente para aumentar essa massa crítica que estamos precisando.

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