Crianças viraram adultos, pais viraram avós. Ecos de infantis agitos deram lugar ao deambular de idosos nas ruas do bairro. Uma escola orfã de alunos albergou serviços administrativos. Decorridos alguns anos, foi solução de alojamento de jovens ociosos, oriundos de famílias com menos de dois dólares de rendimento familiar diário. Ainda o sol não nasceu e já circulam ônibus nas estradas de terra da periferia, numa leva de jovens para um edifício cercado de grades e câmeras de vigilância, a que chamam “escola”. Cinco horas após a chegada, os ônibus devolvem à favela os alunos da manhã. E a cena se repete no turno da tarde, eivada de queixumes:
“Isto aqui é o inferno. Os nossos alunos já chegam cansados à escola e não respeitam ninguém. Temos repetência, birrepetência, trirrepetência. E os que passam estão aquém no currículo. No sexto ano leem silabicamente. O nosso IDEB é muito baixo. E perdemos a nossa pedagoga – foi para outra escola.”
Uma deputada nossa contemporânea diz-nos que o Brasil é um país farto de informações e índices sobre a Educação. Que o MEC conta com o ENEM, o IDEB, a Prova Brasil e a Provinha: O desafio é que nós temos um sistema de avaliação muito sofisticado no Brasil, um dos melhores do mundo. Mas mesmo assim não conseguimos solucionar os nossos problemas. Sobrevivemos com idebs pífios, ancorados em práticas escolares obsoletas.
Se o Einstein nos dizia que a maior insanidade é continuar fazendo sempre a mesma coisa e esperar resultados diferentes, porque se continua insistindo “na mesma coisa”? Por exemplo: porque se insiste na cartesiana segmentação em série/ano de escolaridade, obrigando alunos a estudar os mesmos conteúdos num mesmo ritmo, se, em pleno século XXI e à luz da produção de conhecimento disponível, a prática da “aula” assume contornos de escândalo? Esse e outros arcaísmos, cujo uso contraria o disposto nos PPP de papel, reproduzem um modelo de escola questionado pelo bom senso e cientificamente condenado, enquanto “especialistas”, apesar de terem lido Lauro, Florestan, Freire, disfarçam a impotência sofisticando o discurso.
Na França, assistimos à flexibilização dos tempos de trabalho; nos EUA, à introdução de “modulares”; nos Países Baixos, ao “tempo flexível”. E, se até os jesuítas da Catalunha expulsaram as aulas das suas escolas, por que razão as escolas brasileiras vão adiando a reconfiguração das suas práticas? Deixo-vos a pergunta como “tarefa de casa”, pedindo que busqueis caminhos para melhorar a casa comum.
Quando eu ajudava uma equipe de excelentes professores a emanciparem-se de velhos vícios, tentando “acender uma candeia para não maldizer a escuridão”, a diretora da escola desabafou: Você me incomoda. Eu estava tão bem instalada na minha mentira, desejando a mudança que eu digo que eu quero. Agora… Putz! Porque você me falou a verdade?