Magda Becker Soares, professora emérita da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e uma das maiores especialistas em alfabetização do Brasil, nos deixou nesse último domingo.
Com vasta experiência na arte de educar, Magda dedicou-se a formação docente e pesquisa na área da alfabetização, leitura e escrita, e foi introdutora do conceito de letramento no Brasil. Mesmo aos 90 anos, mantinha contato com alfabetizadores na rede municipal de Lagoa Santa (MG) como colaboradora voluntária.
Magda, que recebeu o Prêmio Jabuti em 2017, na categoria Educação e Pedagogia com o livro Alfabetização: a questão dos métodos, afirmava: nós temos mudado de método a todo momento ao longo das décadas e nunca conseguimos resolver nosso problema de alfabetizar todas as crianças, no tempo certo.
O triste é constatar que a mestra não conseguiu que a política educacional brasileira a ouvisse…porque parece que a “alfabetização na idade certa” tem falhado sistematicamente impedindo a inserção do indivíduo na sociedade. Esse fato é evidenciado pelos baixos índices de proficiência em leitura e escrita do Brasil, agravado pelo advento da pandemia.
E como Paulo Freire dizia, “a alfabetização é mais, muito mais, do que ler e escrever. É a habilidade de ler o mundo…”. Afinal, ter a capacidade de reconhecer letras, símbolos, sílabas, sintetizando-os na formação de palavras e frases não é suficiente para o indivíduo interaja de forma crítica e ativa com o seu meio. Para isso, o sujeito alfabetizado precisa desenvolver a competência de fazer uso, com autonomia e adequação às diferentes situações de comunicação e interação sociais, das habilidades de ler e escrever.
O indivíduo deve ser capaz de interpretar os gêneros textuais e elaborar textos compatíveis com a sua função de comunicar. Não basta ser alfabetizado, precisa ser, também, letrado. Com a leitura, o indivíduo é capaz de mudar e evoluir, atributos fundamentais os num mundo em frenética transformação.
Magda deu a sua contribuição ao mundo, mostrou a necessidade dos educadores que “letrar é mais que alfabetizar, é ensinar a ler e escrever dentro de um contexto onde a escrita e a leitura tenham sentido e façam parte da vida do aluno.” Para ela, a formação docente carece mudança: “os cursos de pedagogia têm história da educação, filosofia da educação, sociologia da educação e nada do que elas precisam saber para atuar na sala de aula.”
O gosto pela leitura se faz pelo hábito de ler, começa na infância e precisa ser estimulada durante todo o processo de aprendizagem. Saber ler e interpretar criticamente é uma atitude cidadã, ainda mais num mundo onde se proliferam as fake news. Ser alfabetizador requer mais do que competência metodológica, requer empatia e criatividade.
Fazer rodas de conversa, exercitar a capacidade de escuta, criar uma mini biblioteca na sala de aula, estimular a troca e o cuidado com os livros, confeccionar livros, realizar saraus literários, ler gêneros textuais variados e por aí vai. Todas essas e outras ações podem fazer parte da prática educativa do educador, para que a leitura se torne um hábito prazeroso para seus educandos.
Ma, enquanto mantivermos a alfabetização na concepção bancária, baseada na transmissão de conhecimentos do educador ao educando, sendo este apenas o objeto da aprendizagem que se encontra vazio e o professor o detentor absoluto do saber, continuaremos negando o mundo a milhares de brasileiros.
Espero que, aonde quer que Magda Soares esteja – junto a Paulo Freire – possa continuar apoiando os educadores na missão de alfabetizar.
Por Cláudia Passos
Uma resposta para “Alfabetizar: um ato de libertação”
Olá
Que texto lindo…que final perfeito! Temos uma grande missão. Agora vislumbramos uma luz…ontem eu ouvi novamente o termo Alfabetização na Idade Certa vindo de uma autoridade. Participei do PNAIC…estávamos bem encaminhados para realizar o desejo da Magda.