Taiaçupeba, 5 de agosto de 2041
Um decreto-lei de 1967, assinado pelo ditador Salazar, consagrava o princípio de que experiências pedagógicas só poderiam acontecer com o beneplácito centralista. Mas, nos idos de vinte e a quase sessenta anos de distância, ainda se constituía em exemplo de inovação normativa. Vejamos.
No artigo primeiro, autorizava “a realização de experiências pedagógicas em estabelecimentos de ensino público”, experiências que poderiam consistir no “funcionamento experimental de novos tipos de estabelecimentos (escolas-piloto)”. E, no artigo terceiro, o Ministro até mandava colaborar nas experiências “agentes de outros estabelecimentos dependentes do Ministério”. Não tardou que uma regulamentação instrucionista e burocrática deitasse por terra as boas intenções do ministro.
O destino deste e de outros documentos de política educacional indiciadores de mudança e inovação dependia do modo como fosse interpretado e… regulamentado. De algum modo, buscavam dar resposta a desafios da “sociedade futura” e proporcionar aos professores oportunidades de maior realização profissional. Porém, os sindicatos concluíram que um projeto de autonomia e flexibilização curricular da segunda década deste século trouxera “mais burocracia e trabalho não reconhecido”.
Pesquisa concluíam que os currículos eram demasiado extensos, que os professores estavam desmotivados, que faltava maturidade aos alunos para o desenvolvimento de projetos, que havia aumento da carga de trabalho para os professores e que era elevado “o número de alunos por turma”. Assim se pronunciavam os pesquisadores:
“Não se pode mudar o paradigma sem mudar as condições nas próprias escolas”.
Quando questionada, a coordenadora de uma das pesquisas disse não haver condições para o implementar projetos nas escolas:
“O projeto não trouxe uma mais-valia em termos de aprendizagem dos alunos”.
Tudo era remetido para o teor dos projetos político-pedagógicos. Mas, se era bem verdade que “as opções de natureza curricular, designadamente os critérios de organização e de gestão pedagógica”, estavam inscritas no projeto, saberia o ministério dizer-nos quantos professores conheciam o teor do seu projeto político-pedagógico?
Na década de 1990, integrei uma comissão do Conselho Nacional de Educação encarregada de emitir um parecer sobre uma proposta de base curricular. Organizamos debates e audiências. O “Parecer” apontava a necessidade de alteração do modelo escolar. Mais do que elencar propostas de alteração, reiterava a recomendação do relatório de avaliação: para concretizar a base curricular no chão da escola, seria necessário substituir práticas de “ensino tradicional” por práticas coerentes com o discurso teórico do preâmbulo da proposta de lei.
As nossas recomendações foram ignoradas. A lei foi aprovada. Visava-se a melhoria da qualidade da educação, mas a educação não melhorou. E, em 2017, o Ministério da Educação, lançou nas escolas mais um projeto de base curricular, que também não se cumpriu. Perdêramos vinte anos de oportunidades de mudança.
Até aos idos de vinte, o Brasil havia produzido mais de um milhão de leis. Mas, no campo da educação, parecia que a única lei que se cumpria era a “lei da gravidade”, a burocracia imperava e a pedagogia continuava adiada. Em 2021, durante uma visita a Taiaçupeba e ao projeto “ecofuturo”, radicou em mim a certeza de que, em Mogi das Cruzes, o tradicional “fatalismo pedagógico” daria lugar a um projeto de mudança e inovação. Disso vos falarei, numa outra cartinha.
Por: José Pacheco