Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (CCXVII)

Campo Azul, 13 de setembro de 2040

Netos queridos, espero não vos maçar, se insistir no reforço da observância do pensamento de Anísio Teixeira para a educação. Esse mestre insigne afirmava ser dispensável o “transporte escolar” que, nas primeiras décadas deste século foi sacrifício para as crianças e fonte de desperdício. Muitos milhões de reais eram desperdiçados, para deslocar alunos do seu lugar de origem para dentro de prédios a que chamavam “escola”. Anísio aconselhava a “fazer escolas nas proximidades das áreas residenciais, para que as crianças não precisassem andar muito para alcançá-las e para que os pais não ficassem preocupados com o trânsito de veículos (pois não teria tráfego de veículos entre o caminho da residência e da escola), obedecendo a uma distribuição equitativa e equidistante.

Esses e outros anseios se materializam na proposta (teoricamente) assumida pela secretaria, no enunciado de princípios, como o da Integralidade:

“Propõe-se que cada Escola de Educação Integral, ao elaborar seu projeto político-pedagógico, repense a formação dos estudantes de forma plena, crítica e cidadã, reorganizando os tempos escolares e inserindo, por meio de práticas fundamentadas pela pedagogia histórico-crítica, espaços e tempos de aprendizagens, com vistas a garantir o princípio da integralidade”.

Ousei questionar: cadê as práticas fundadas na “pedagogia histórico-crítica”? Não as havia.

Outro princípio era (teoricamente) enunciado, o da Transversalidade:

“A ampliação do tempo de permanência do aluno na escola deve garantir uma Educação Integral, que pressupõe a aceitação de muitas formas de ensinar e aprender, considerando os diversos conhecimentos que os estudantes trazem de fora da escola. A transversalidade só faz sentido dentro de uma concepção interdisciplinar de conhecimento, vinculando a aprendizagem aos interesses e aos problemas reais dos estudantes e da comunidade”.

Mas, cadê as “muitas formas de ensinar e aprender”, se única forma de ensinar imposta pela secretaria era a aula?

Vejamos outro princípio, o da Gestão Democrática:

“As escolas que buscam a qualidade da educação pública devem investir no diálogo com a comunidade. Na Educação Integral é necessária a transformação da escola num espaço comunitário, legitimando-se os saberes comunitários como sendo do mundo e da vida. Assim, o Projeto Político-Pedagógico implica pensar a escola como um polo de indução de intensas trocas culturais e de afirmação de identidades sociais dos diferentes grupos presentes, com abertura para receber e incorporar saberes próprios da comunidade, resgatando tradições e culturas populares”.

Mas, cadê a “comunidade”, o “diálogo com a comunidade”, a “transformação da escola num espaço comunitário”, se os pais não podiam passar da portaria?

Completando a “análise de conteúdo”, vejamos o que o documento nos dizia sobre Territorialidade:

“Significa desenvolver a educação para além dos muros escolares, entendendo a cidade como um rico laboratório de aprendizagem. Não serão os prédios públicos ou privados que garantirão, de fato, a realização deste Projeto. Ele pode ocorrer em praças, clubes, cinemas, comércio local, teatro, em horários organizados conforme os objetivos de aprendizagem”.

Uma última pergunta:

Se assim rezava o documento basilar da política educacional da secretaria, por que razão a secretaria remetia a “aprendizagem” e a “educação” para dentro das quatro paredes de uma sala de aula?

Por: José Pacheco

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