Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (CCXLVIII)

Três Marias, 14 de outubro de 2040

In illo tempore… encontrei um modo de não desesperançar. Fui plantar árvores no “Jardim do Éden” e nele concebi um santuário para os pássaros. Porém, não voltei às personificações, como havia feito no “Para Alice, com Amor”. Deixei essa tarefa para quem sabia mais de pássaros do que este vosso avô.

O amigo Tuck era um sábio observador dos pássaros e nos deliciava com belas descrições dos hábitos de alados seres, enquanto se mantinha atento aos maus hábitos de desumanos seres. Guardei essas observações nuns ficheiros que, se quiserdes, vos enviarei. Nelas, o Tuck religou ornitologia e poesia. Menos poéticas, ainda que justas, eram as considerações do meu Mestre de Atibaia acerca dos crimes praticados pelo instrucionismo. Eis alguns:

“Não permitir que a Constituição seja cumprida. Dar a ideia de que “é na escola que se aprende”. Isso talvez explique as presepadas de quem “já saiu da escola” e esqueceu que devemos continuar aprendendo/pesquisando até a morte (quiçá após ela também). Ensinar que só se aprende estando com quem tem a mesma idade. Poucas coisas são tão absurdas quanto isso. Por mais que existam fases da vida, isso passa longe de idades confinadas e de que alguém de 60 não possa aprender com alguém de 15, que crianças de 13 não interagem com os “pequenos” de 8. (Muito do bullying inclusive nasce aqui, pela escola ter uma dificuldade imensa em viver a diferença).

Inventar a figura da “professora solitária” com seus 40. Não conheço uma pessoa no mundo (fora “gestores políticos” e empresários) que defenda isso.

Não saber diferenciar ensino de aprendizagem, além de ter toda uma estrutura formativa para quem quer ENSINAR, mas quase nada sobre COMO SE APRENDE. O resultado é massificação: quanto mais alunos couberem numa sala melhor, é a mesma lógica do ônibus lotado, com um problema, nessa educação, o busão tem o tamanho de uma moto, com a quantidade de um sanfonado e vai derrubando e atropelando pelo caminho.

Dividir os TEMPOS por “matéria” e ainda dar um INTERVALO. Como se o intervalo fosse o período ‘onde não se aprende’. A aprendizagem se faz na relação, e em sala de aula, a relação é substituída por transmissão.

Adotar o ASSISTIR como principal ação. Assistir aula é como assistir TV. Filme alunos assistindo aula… e depois filme alunos pesquisando sobre o que lhes interessa. Vai entender esse crime rapidinho.

Separar a escola da família. Um educador tem sua função. Uma mãe tem a sua. Uma diretora tem a sua. Uma criança tem a sua. E, ainda assim, todos são escola. A ideia de que escola é só quem trabalha lá, ou pior, que é o conjunto de tijolos revestido com tinta é um crime.

Formar baseado em teoria apenas. A formação de professores hoje é quase uma total abstração. Imagine se um médico se formasse da mesma forma. A formação é toda pautada em instrução teórica, e distante do “aprender com”. É claro que vai dar errado na outra ponta.

Infantilização dos educadores, bestialização das crianças e coisificação humana. Achar que para criança aprender você precisa virar do avesso, dar piruetas e tratar a criança feito bocó. Achar que para “ensinar” é preciso do “Cantinho da Professorinha Corujinha”, do EVAzinho, do Grupo de Atividades Prontas… ou simplesmente, como fazem alguns, de achar que todos aprendem a mesma coisa, no mesmo tempo e da mesma forma”.

O Tuck era sábio. E partilhava a sua sabedoria com aqueles que, como ele, tomando consciência dos crimes que uma administração educacional fora-da-lei praticava, recolocaram as escolas dentro da lei.

 

Por: José Pacheco

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